domingo, 13 de setembro de 2009

E lá vai Soninha falar sobre maconha e outras drogas

Em palestra para universitários, vice-prefeita da Lapa chama a atenção para desinformação sobre o tema.

Valdir Sanches - 10/9/2009 - 22h37






Pablo de Souza/LUZ
Lembrança: 'Sei exatamente o dia em que decidi que ia usar maconha' .
Soninha Francine, todo mundo sabe, fumou maconha. E não escondida: saiu na capa da revista Época assumindo o que fazia. Isto foi há oito anos. Hoje tem um cargo importante na Prefeitura: é vice-prefeita da Lapa. Esta noite (quarta-feira passada) está sendo esperada por universitários do Instituto Singularidades, em Pinheiros, para falar de drogas e jovens. Como abordará a questão da maconha?
Entra no pequeno auditório, cheio. Quem não a conhece achará que é mais uma universitária chegando para a palestra. Jeans do estilo "surrado", camiseta, tênis de pano, colares de vidrilhos. O blusão, tirou e amarrou à cintura. Começa:  "Alguém aí já usou droga?" Risos, e tal. "Eu já usei duas vezes, hoje. Tomei dois cafés." Define café como droga estimulante. É o ponto de partida para falar das drogas lícitas, como álcool, e ilícitas, como a maconha. Quanto a estas, diz que é preciso ao menos poder falar, sem medo.
Em dado momento, surpreende a platéia: "Eu sei exatamente o dia em que decidi que ia usar maconha. Foi depois de uma palestra na escola sobre... o perigo das drogas". Risos.
Soninha começa falando de um jogo de vôlei na escola em que estudava, em Santana. As adversárias, de outra escola, estavam extremamente agressivas. "Minha mãe me disse: 'Acho que essas meninas usaram maconha'. A mãe disse também ter visto algumas fumando com a mão em concha. Foi a primeira vez que ouvi a palavra maconha", diz Soninha. "Eu fiquei fascinada".
Depois, na quinta-série, aos dez anos, veio a tal palestra sobre drogas, dada por um médico da Polícia Civil. Ele mostrou fotos chocantes, de dependentes em abstinência de cocaína. "Eu fiquei impressionada". O médico também alertou sobre os malefícios da maconha, entre eles perda de concentração. "Mas a maconha não achei tão preocupante".
Então, o palestrante injetou um preparado com cocaína em um ratinho, e o animal ficou agitadíssimo, olhos saltados. Em outro ratinho, injetou maconha. "Ele deitou de lado, o médico mexia nele e ele nem se abalava". Imita, pousando o rosto no ombro, para demonstrar languidez. A platéia se diverte. Soninha conclui: "Eu tinha dez anos. Pensei: quando crescer vou fumar maconha".




Pablo de Souza/LUZ
"Não acho que o que a gente faz é problema só nosso. Nós não podemos fazer tudo o que der na telha".
Por que as pessoas usam drogas?, pergunta. "As pessoas usam álcool por vários motivos, mas quando se fala de drogas como maconha o diagnóstico vem pronto: quem usa é desajustado, quer fugir de problemas, vem de uma família desestruturada". Para álcool, café e cigarro, diz, pode-se questionar: "Em vez de perguntar por que não se deve usar, não é mais sensato perguntar em que condições não se deve?".
"Quando se fala de outras drogas (como maconha) essa discussão é praticamente impossível". Soninha pergunta à platéia se é possível usar maconha sem que isso prejudique a vida da pessoa. Sim, muitos respondem. E ela: "Independentemente de opiniões, o fato é que é possível fazer uso de maconha sem que isso transforme a vida numa ruína". Nova pergunta: conhecem alguém que usa ou usou maconha, e ainda assim teve um bom rendimento escolar, e no trabalho, e possui uma família equilibrada? Sim, muitos.
Soninha acha que não adianta proibir alunos de usar droga. Defende o entendimento, "um pacto de conduta". Um pacto não é garantia, diz, mas há mais chances de sucesso. Outro ponto é manter uma conversa "direta, franca" com ambulantes que atuam perto das escolas – e que podem oferecer drogas.
"Combater o uso, dizer 'não pode' e fingir que o problema não existe não funciona". Não acredita que mostrar dados sobre efeitos de drogas dê resultado, mas que se deve chamar atenção para os riscos.
Sair de um lugar bêbado, ficar na calçada, ter vômitos, depois dor de cabeça. Não se preocupar com nada, "transar sem camisinha". Vale a pena?  Soninha acha um dever da sociedade, do Estado, reduzir o uso indevido de drogas. Ou seja, o uso de quantidade em que a pessoa perde a noção, o controle sobre si mesmo. 
Muitos jovens usam drogas pela sensação de prazer ou como afirmação perante outros grupos, pondera a subprefeita. Um antídoto seria oferecer alternativas de prazer, como, entre inúmeras, música, capoeira. Cerveja poderia entrar, "mas não como instrumento principal do prazer". Acha que esporte e cultura não garantem o resgate dos jovens, das drogas. "Mas podem diminuir a relação com elas." 
"Na vida real a gente fala com pessoas que usam drogas, de todo tipo. Eu (pergunta) acho que tudo bem, cada um faz o que quer da vida, somos todos livres, vivemos em sociedade? Não, não acho. Não acho que o que a gente faz é problema só nosso. Não podemos fazer o que der na telha".
Portanto, o uso de drogas tem regras. "Dirigir bêbado, tudo bem? Não, porque você pode matar alguém. Não temos liberdade absoluta, há o direito do outro".
Existem drogas que se pode usar, como remédios, e as que são proibidas, diz a lei. "Essa divisão é um pouco arbitrária. A lei tem um artigo que fala sobre o que é proibido, não pode ser produzido, vendido, trocado. Ué, álcool não é uma substância que se compra e vende? Dependendo da quantidade que você toma ela produz alteração de consciência."
Nova pergunta: álcool pode causar dependência? Sim, responde a platéia. Soninha diz que as leis são complexas, e querem resolver tudo. Por isso, ficam difíceis de aplicar. "É interessante uma lei que seja mais genérica, e com o tempo você vai detalhando".
A compra de droga é um risco sério, diz. Nesse momento, os usuários tem que ser relacionar com "foras da lei". Como só há comércio ilegal, "você só tem o crime". Conta que uma vez lhe fizeram esta pergunta: o que você faria se soubesse que suas filhas fumavam maconha. "Eu perguntaria: onde você comprou isso?".
Soninha tem explicado, em entrevistas, que há tempos parou de usar maconha.