sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Senado pagou R$ 66,7 mi em horas extras em 2009



Sufocada a crise, reforma administrativa de Sarney empaca

  Lula Marques/Folha
Em fevereiro, ao virar presidente do Senado pela terceira vez, José Sarney prometera realizar uma ambiciosa reforma administrativa.


Depois, assediado por denúncias de malfeitos, Sarney fizera da reforma sua principal trincheira. Cortaria pessoal, cancelaria contratos, extinguiria privilégios.

Decorridos quase nove meses da posse de Sarney, o projeto encomendado à Fundação Getúlio Vargas, base da reforma, tornou-se um adorno de gaveta.

As denúncias contra Sarney desceram ao arquivo. Sua presidência foi salva por uma operação que traz impressas as digitais de Lula.

E a reforma, supostamente concebida para aliviar a Viúva, não produziu senão um gasto por ora inútil: R$ 250 mil pagos à FGV pelo estudo engavetado.

O Senado revela-se incapaz de implementar até mesmo os ajustes mais simplórios. Em março, prometera-se, por exemplo, instalar um ponto eletrônico.

Serviria para deter o descalabro das horas extras. A Folha revelara: em pleno recesso parlamentar, 3.883 servidores haviam recebido R$ 6,2 milhões em extras.

“Acho que vamos instalar imediatamente o ponto eletrônico”, Sarney reagira à época. Nada. Em julho, nova promessa.

O primeiro-secretário Heráclito Fortes viera aos holofotes para informar: lançaria por aqueles dias uma licitação para adquirir o equipamento do ponto digital.

Estaria funcionando em agosto, Heráclito assegurara. Lorota. Em reportagem levada às páginas do Correio (só para assinantes), o repórter Ricardo Brito informa:

1. A licitação ainda não foi feita. A primeira secretaria alega que encomendou a providência à direção-geral do Senado.

2. A direção-geral responde que a tomada de preços ainda depende da conclusão de estudos. Não tem data para acontecer.

3. Sob controle frouxo, as horas extras continuam sendo pagas à larga. Desde janeiro, os adicionais renderam aos servidores R$ 66,7 milhões.

4. Na chegada, não se exige o ponto dos beneficiários. Para se creditar dos extras, basta que o funcionário permaneça no Senado até 20h30.

5. O horário de saída é registrado numa rede eletrônica interna do Senado. A burla ao sistema não é incomum.

Noutra reportagem, escrita por Leandro Colon e veiculada peloEstadão, esquadrinhou-se a pseudoreforma que Sarney conserva na gaveta.

A folha de salários dos servidores efetivos continua intocada: R$ 2,1 bilhões ao ano. Os terceirizados estão sendo estão sendo poupados da lâmina.

O número de comissionados –assessores contratados pelos senadores, sem concurso— permanece o mesmo: 2,8 mil cabeças.

No último final de semana, o blog noticiara que o Senado não conseguiu reduzir nem o quadro de faxineiros.

Submetida a uma nova licitação, a empresa Fiança Serviços Gerais Ltda, reavaliara o valor do contrato.

Cobrava R$ 15,6 milhões mensais para manter o asseio no prédio do Senado. Derrubou o valor para R$ 8 milhões. Economia de R$ 7,6 milhões anuais.

O que fez Sarney? Anulou a licitação. Em despacho publicado na segunda (19), o senador escreveu que a economia seria “mínima”.

Acrescentou: "É irrefutável que tal redução não possa se dar em detrimento dos menos favorecidos, dos mais humildes".

Alegou que a redução salarial seria inconstitucional. Conversa fiada. A comissão de licitação já havia enfrentado o problema.

Parecer oficial, ignorado por Sarney, esclarecera o óbvio: “O Senado não tem vínculo patronal com qualquer trabalhador terceirizado". A relação é com a empresa.

De resto, o Senado está renovando, em conta-gotas, os contratos com outras empresas terceirizadas.

Prorrogou, por exemplo, a contratação da Servegel, que fornece pessoal para o arquivo.

Fez o mesmo com Adservis, que provê mão-de-obra técnica para o setor que cuida do áudio do plenário e da TV Senado.

Há nesse contrato pelo menos 280 terceirizados com algum grau de parentesco com servidores efetivos do Senado. Nada foi feito contra o nepotismo mal disfarçado.

Ou seja, sob a “nova” presidência de Sarney, sobrevivem no Senado os velhos vícios.

Vícios que nasceram ou foram tonificados ao longo dos últimos 15 anos -sob Agaciel Maia, o ex-diretor-geral que Sarney nomeara na sua primeira presidência.